O Sortilegio Estetico - Vitor Sousa

Victor Sousa 70 anos

A Associação Kulungwana e o Instituto Guimarães Rosa/Centro Cultural Brasil-Moçambique apresentam duas exposições do artista Victor Sousa pela passagem dos 70 anos do seu nascimento. Estas exposições retratam a importância deste artista no contexto das artes plásticas moçambicanas. Victor Sousa tem uma extensa obra produzida em Moçambique. Lembrado, muitas vezes, como tendo sido o primeiro professor moçambicano de artes plásticas na Escola Nacional de Artes Visuais. Foi também pintor, gravador, ceramista e escultor. Esteve sempre ligado ao Núcleo de Arte e a uma geração de artistas do seu tempo e a novos artistas que passavam frequentemente pelo seu atelier. Sem dúvida foi uma das figuras incontornáveis da arte moderna moçambicana.

 Na galeria da Kulungwana estão apresentados os trabalhos na técnica de monotipia pertencentes a coleção do Engenheiro Álvaro Henriques, um importante colecionador da arte moçambicana. Começou a colecionar obras de Victor Sousa no início dos anos 80. A sua amizade por Victor e o reconhecimento pelo valor da obra tornaram-no num dos maiores colecionadores deste artista. Esta dupla exposição, para além de ser uma homenagem pelos 70 anos de nascimento, é também uma importante oportunidade de conhecer e compreender o que se coleciona e como se coleciona a arte em Moçambique. As coleções permitem ampliar as oportunidades de conhecer os artistas.

 Os trabalhos de monotipia apresentados revelam um constante exercício técnico de soluções plásticas encontradas a cada passo de trabalho. Passou pela gravura em metal, pela linogravura e pela xilogravura. Mas foi na técnica de monotipia que mais consolidou a obra gráfica. Esta permitiu um trabalho de procedimentos e de resultados, de incertezas e de casualidades, do rigor técnico a espontaneidade das composições e de ser permanentemente aprendiz. Não há certeza absoluta no final do trabalho. Trabalhou em inúmeros temas. O importante era a impressão da vida através dos materiais que juntava para compor a matriz.

O Instituto Guimarães Rosa/Centro Cultural Brasil-Moçambique apresenta cerâmicas da coleção da família. São obras realizadas entre os anos 80 e 2016. Este conjunto permite uma leitura das várias abordagens e caminhos que o artista teve nesta linguagem. Foi na cerâmica que abriu espaços e procedimentos da construção da forma utilizando técnicas de pintura com engobes, vidrados, assemblage que enriqueceram o diálogo entre forma/material/linguagem.

Iniciou a cerâmica como um desdobramento da olaria, da forma cilíndrica, de formas de objetos para uma intervenção mais espontânea. A figura da mulher toma ao longo dos anos a imagem central. Mas há um importante conjunto de painéis cerâmicos feitos a partir de azulejos vidrados e quebrados intencionalmente que revelam uma outra face do artista. A paixão pela técnica do vidrado que o fez um criador insaciável pelo processo construtivo e pelo resultado que muitas vezes nos surpreende a cada experimentação.

 As cerâmicas e as monotipias têm em comum num certo período da sua produção as perguntas em relação ao seu universo familiar e cultural onde os objectos aparentemente frágeis poderiam estabelecer diferentes diálogos. Foi sempre a figura feminina que simbolizou a iconografia de uma nação.

 Esperamos com estas duas exposições vincar a importãncia deste artista no ensino das artes plásticas e na extensa obra artística.

 

Jorge Dias

Curadoria e Expografia

Julho de 2022